Nada de varrer pra baixo do tapete: podem imaginar a dor de um ser humano que é invisível? É como se sentem os garis, incapazes de despertar sequer um “bom dia” dos demais humanos que cruzam na rua com eles. Eles estão ali, mas não são humanos, são coisas, uma farda, uma função, sei lá. E depois de anos, a dor e a estranheza inicial do “ué, ninguém tá me vendo aqui?” torna-se costume e talvez eles nem mais se dêem ao trabalho de levantar os olhos para ver as pessoas. Só eles, o lixo e as vassouras. Aliás, se o violão é o companheiro poético do tocador, imaginem se as vassouras falassem: quantos segredos, quantos causos, quantas surpresas! Se a bruxa voa nela, é ela quem liga o gari à terra asfaltada, espada para o desafio diário.
Este ano começou com a polêmica sobre o famoso apresentador que admirou-se com o horror dos rapazes da “mais baixa escala de trabalho” estarem ali na TV, fazendo comercial e desejando um ano próspero. Como pode uma gente que ganha pouco, fede, é invisível, ainda por cima tentar a visibilidade no grande veículo de comunicação de massa e surgir sorrindo, positivos e confiantes de um ano bom? O que para alguns seria uma simpatia, para o jornalista foi o motivador da incredulidade. Honestamente, em nome de quantos esta sensação é real? Quantos acham que a pele destes senhores está impregnada do chorume? A quantas anda nossa piedade capitalista e, mais que isto, nossa luta pela insalubridade e ganhos econômicos maiores para quem recolhe a nossa podridão? Como vamos lidar com a decomposição lenta e os problemas que o lixo trouxe ao longo da história, para as sociedades? Pois terminem 2010 lendo a tese do psicólogo Fernando Braga da Costa, da USP, que se vestiu de gari durante longo tempo e disse que virou um poste, um orelhão, objeto do mobiliário urbano. “Vindos do Nordeste, negros ou mulatos na maioria, vivem encolhidinhos, olhando pra baixo; os garis são carregados na caçamba da caminhonete junto com as ferramentas. É como se eles fossem ferramentas também”.
Este ano começou com a polêmica sobre o famoso apresentador que admirou-se com o horror dos rapazes da “mais baixa escala de trabalho” estarem ali na TV, fazendo comercial e desejando um ano próspero. Como pode uma gente que ganha pouco, fede, é invisível, ainda por cima tentar a visibilidade no grande veículo de comunicação de massa e surgir sorrindo, positivos e confiantes de um ano bom? O que para alguns seria uma simpatia, para o jornalista foi o motivador da incredulidade. Honestamente, em nome de quantos esta sensação é real? Quantos acham que a pele destes senhores está impregnada do chorume? A quantas anda nossa piedade capitalista e, mais que isto, nossa luta pela insalubridade e ganhos econômicos maiores para quem recolhe a nossa podridão? Como vamos lidar com a decomposição lenta e os problemas que o lixo trouxe ao longo da história, para as sociedades? Pois terminem 2010 lendo a tese do psicólogo Fernando Braga da Costa, da USP, que se vestiu de gari durante longo tempo e disse que virou um poste, um orelhão, objeto do mobiliário urbano. “Vindos do Nordeste, negros ou mulatos na maioria, vivem encolhidinhos, olhando pra baixo; os garis são carregados na caçamba da caminhonete junto com as ferramentas. É como se eles fossem ferramentas também”.
Pois estamos em dívida com estes amados e imprescindíveis trabalhadores. Precisamos dar uma aliviada, fazer um chamego nestas almas que devem aparecer. Em nome dos excluídos, desejo-lhes um ano de justiça, onde cada um de nós olhemos no fundo dos olhos do primeiro gari que encontrarmos na rua, e vamos dar um sonoro “bom dia”, para tirá-los da sensação de invisibilidade, e deixar claro o sinal da existência. Subam nas vassouras e partam para o lugar onde nascem os sonhos!
Por Milton Cunha, carnavalesco e Doutor em Ciência da Literatura pela UFRJ, extraído do Site: http://odia.terra.com.br/portal/opiniao/html/2010/12/milton_cunha_do_alto_de_nossas_vassouras_133485.html e de seu Blog: http://odia.terra.com.br/blog/miltoncunha/
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