quinta-feira, 13 de março de 2014

CRÔNICA SOBRE A GREVE DOS GARIS

Greve dos garis cariocas foi tapa na cara do Brasil esnobe
Sempre tive o maior respeito pelos garis. São eles que fazem aquilo que você certamente tem nojo: recolher o lixo de uma cidade inteira. Para piorar, somos um dos países mais ‘porcalhões’ do planeta, uma nação desprovida de uma única rua totalmente limpa. É, é isto mesmo. Tente encontrar um lugar sequer sem um papel amassado no chão, uma bituca de cigarro, um palito de sorvete ou qualquer outra coisa jogada por alguém. Não existe. O Brasil é um país imundo. Em vários sentidos, diga-se de passagem...
Pois não é que rolou uma greve dos garis do Rio na semana passada? Justo eles, considerados por grande parte da população como “gente desqualificada profissionalmente” - o que é um tremendo absurdo! -, como se recolher o lixo e tirar das ruas qualquer coisa que as pessoas tenham desprezado fosse um atestado de fracassado. E a turma foi esperta na hora de reivindicar melhores salários e mais benefícios para a sua profissão: escolheu exatamente o final do Carnaval, o evento que melhor representa a total falta de educação e de cidadania do brasileiro. Perfeito!
Não foram poucas as pessoas que ficaram indignadas com esta classe trabalhadora. Tenho certeza que todas elas contribuíram bastante para a imundice que assolou o Rio dias atrás. Inclusive o próprio prefeito da cidade, Eduardo Paes, flagrado pelas câmeras ao jogar um pedaço de sanduíche no chão.
A bronca desta gente tratou os garis como se fossem escravos amotinados dentro de um navio negreiro. O prefeito Eduardo Paes demitiu trezentos garis e ameaçou demitir mais novecentos, uma juíza multou o sindicato da categoria em R$ 50 mil reais por dia e este, por sua vez, tratou de “tirar o seu da reta” ao apregoar pelas mídias que a greve era “coisa de um trezentos aí”.
Foi então que aconteceu o que para alguns seria impensável: os garis saíram em passeata pelas ruas do Rio e foram... aplaudidos! É, isto mesmo. A população da tal “Cidade Maravilhosa” se pôs a bater palmas para aqueles que marchavam pela conquista de um salário minimamente digno. Até então, um gari carioca recebia R$ 803 mensais, mais um ticket de refeição diário de inaceitáveis R$ 12, sem qualquer direito a horas extras – ou seja, trabalhavam nos fins de semana, feriados, Carnaval e Ano Novo de graça!!! – ou qualquer ganho por insalubridade.
No fundo, centenas e centenas de cariocas nas calçadas fizeram questão de manifestar o seu repúdio em relação à desigualdade social decorrente da já enraizada corrupção em todas as esferas do Brasil, principalmente na classe política e também nos sindicatos, cada vez mais cúmplices dos poderosos. Os garis foram os seus “heróis”.
Vendo que a situação iria piorar em velocidade supersônica, o prefeito capitulou e, a partir de agora, cada gari carioca vai ganhar R$ 1.100, mais ticket refeição de R$ 20, direito à hora extra e 40% de insalubridade pelo trabalho que fazem.
Sei que tem gente que acha que os garis são seres invisíveis, mas torço para que até mesmo estas pessoas desprezíveis tenham percebido que tudo isto é um sinal, um fio de esperança. Talvez não estejamos tão insensíveis às humilhações impostas aos menos favorecidos...
Imagem: Latuff 2014

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MURAL DO GARI