quinta-feira, 20 de agosto de 2009

HISTÓRIAS DE UM GARI

Ninguém daria nada por aquele homem. Na verdade, as tantas pessoas que transitavam em frente aos pavilhões do Rio Centro nem reparavam nos que cumprem um papel essencial no Pan. De longe se avistava uma figura que empurrava um carrinho de lixo. Por trás do uniforme laranja da COMLURB (Companhia de Limpeza Urbana - RJ), um par de olhos atentos registra todos os movimentos dos Jogos. Crítico e de opinião aguçada, o gari Ricardo Sarmento, 32 anos, morador do bairro Oswaldo Cruz, na capital carioca, cativa também pela receptividade e pela comunicatividade.
São 800 pessoas trabalhando na limpeza do Pan Rio, 75 apenas no complexo esportivo do Rio Centro. Ricardo, em um misto de seriedade e compenetração, explica que muitos receberam treinamento específico para trabalhar no evento, inclusive com aulas de inglês e espanhol. Uma das orientações importantes repassadas foi a de estar sempre atento a qualquer lixo ou material suspeito. Quando encontrado, devem chamar a polícia no mesmo momento.
Trabalhar no Pan-americano tem um gostinho especial para Ricardo. Judoca desde os 18 anos, campeão carioca infantil e juvenil, professor e árbitro de judô, ele vê no evento a possibilidade de estar sempre em contato com o esporte, pois presencia tudo que ocorre nos Jogos, além de assistir a algumas lutas de judô nos momentos livres. Contando sua história de vida, nem parecia que ali estava um gari. Entre tantos, se destacava.
Se por um lado o gari se encanta pela beleza do Pan, por outro critica alguns pontos, que considera falhos no evento. Um dos pontos que destacou foi sensação de discriminação que os garis sentem. Segundo Ricardo, eles são obrigados a passar por revista, sendo que as demais pessoas que também trabalham nos Jogos não precisam. Com indignação estampada no semblante, definiu: a impressão que se tem é que as pessoas não confiam neles por serem garis. Com isso, a relação entre a segurança e a limpeza fica desgastada e estressante, completa.
Quanto mais falava, mas assumia propriedade de quem sabe o que está dizendo. Com segurança, apontou ainda outro aspecto negativo da organização do Pan e também da prefeitura: o não fornecimento de alimentação para os garis. "A gente trabalha doze horas por dia, sem receber adicional e ainda temos que trazer a comida de casa, que fica fria porque nem tem onde esquentar", reclama. No caso dele, prefere pagar para comer e ainda há a dificuldade por não ter muitos lugares próximos ao Rio Centro.
Além de suas opiniões e crítica, Ricardo Sarmento também é bastante atento à tudo que ocorre no evento. O trabalho de limpeza permite-lhe observar as pessoas e os acontecimentos sem que ninguém repare. Ele conta que há muitos cambistas vendendo ingressos e que eles sabem agir muito bem para não serem pegos pela segurança. "Daqui eu vejo um cinco ou seis cambistas ali na entrada", afirma com certeza colocando em prática o olhar aguçado.
Ricardo, além de gari, judoca, observador e crítico, é também torcedor. Como não poderia deixar de ser, adora a festa dos Jogos Pan-americanos, o clima de competições e diversão. Nesse momento o semblante de homem sério se desfaz. Um largo sorriso aparece no rosto. E já vai logo dizendo, como todo bom brasileiro: "estou torcendo para o Brasil. Não importa quem e qual modalidade. O que ganhar está valendo".
Extraído do ClickPan 2007 - Por Gabriela Canseco, em 21/07/2007

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MURAL DO GARI